Este espaço é sobre cinema clássico, de obras consagradas a esquecidas. Dedico a meus pais, que, nas longínquas noites de Santa Maria (RS) do final dos anos 70 e início dos 80, permitiam que eu visse filmes na TV. Foi quando descobri o grande espetáculo – Ben-Hur, Cleópatra, El Cid, Lawrence da Arábia, Doutor Jivago. Parafraseando o escritor argentino Jorge Luis Borges, foram os primeiros que vi, e, possivelmente, serão os últimos.
quarta-feira, 30 de maio de 2012
Ladrões de Bicicletas
Roma, 1948. A Itália, mergulhada em profunda crise socioeconômica, tenta se erguer dos destroços da Segunda Guerra Mundial.
Após dois anos desempregado, Antonio Ricci (Lamberto Maggiorani) consegue ocupação, como fixador de cartazes. Mas é necessário ter uma bicicleta para exercer a função. Antonio e mulher Maria (Lianella Carell) penhoram os lençóis da família para obtê-la. No primeiro dia de trabalho, ela é furtada. Em uma busca desesperada por ruas e becos da Cidade Eterna, Antonio e o filho, o pequeno Bruno (Enzo Staiola), procuram recuperá-la. Por fim, o pai enfrenta, em nome da sobrevivência, um dilema moral.
Muito se discutiu a respeito de Ladrões de Bicicletas (Itália, 1948), do ator e diretor Vittorio De Sica. Depois de considerá-lo um dos melhores filmes do mundo, parte da crítica passou a tachá-lo de melodramático, de excessivamente sentimental.
Pouco importa. A obra mantém-se viva. Preserva a força de comover o público.
Transcorridos 64 anos, ganhou repentina atualidade. O capitalismo europeu, neste momento, atravessa graves dificuldades. E a Itália é um dos países mais afetados.
O elenco de Ladrões de Bicicletas é todo amador – Maggiorani era operário em uma fábrica na capital –, o que cria a sensação de alta autenticidade. Pela força da composição estética, conteúdo dramático e interpretação dos atores, é um emblema do neorrealismo italiano, movimento cultural cuja pedra angular é a preocupação social. Arrebatou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, à época uma categoria especial.
Uma curiosidade: para fazer o menino chorar, De Sica escondeu um maço de cigarros no casaco dele e o acusou de ladrão. O garoto ficou em prantos.
Um clássico.
segunda-feira, 28 de maio de 2012
Anna Karênina (Parte 2)
A abertura do romance Anna Karênina é célebre: "Todas as famílias felizes são parecidas entre si. As infelizes são infelizes cada uma da sua maneira".
Embebido com essa máxima, o diretor francês Julien Duvivier empreendeu sua versão da obra tolstoiana (Reino Unido, 1948). Vivien Leigh interpreta a trágica heroína, nove anos após alcançar o auge da fama ao viver Scarlett O'Hara, em E o Vento Levou. Ralph Richardson é o marido traído, Alexei Karenin, enquanto Kieron Moore incorpora o amante, conde Vronsky.
Ao contrário da adaptação de Clarence Brown, de 1935, Anna Karênina de Duvivier enfatiza mais a relação distante e insípida do casal Anna-Alexei. Duvivier palmilhou, explicitamente, o caminho que leva Anna a sucumbir aos apelos amorosos de Vronsky.
Tal qual Brown, Duvivier, mesmo sem transmitir a força plena da obra de Leon Tolstói, oferece uma película de qualidade. Ele tem a preocupação de retratar, com cuidado, o ambiente social dissimulado da aristocracia russa do século 19.
Duviver é considerado um dos principais representantes do cinema francês. Não por acaso, Orson Welles, o criador de Cidadão Kane e A Marca da Maldade, nutria por ele admiração.
Embebido com essa máxima, o diretor francês Julien Duvivier empreendeu sua versão da obra tolstoiana (Reino Unido, 1948). Vivien Leigh interpreta a trágica heroína, nove anos após alcançar o auge da fama ao viver Scarlett O'Hara, em E o Vento Levou. Ralph Richardson é o marido traído, Alexei Karenin, enquanto Kieron Moore incorpora o amante, conde Vronsky.
Ao contrário da adaptação de Clarence Brown, de 1935, Anna Karênina de Duvivier enfatiza mais a relação distante e insípida do casal Anna-Alexei. Duvivier palmilhou, explicitamente, o caminho que leva Anna a sucumbir aos apelos amorosos de Vronsky.
Duviver é considerado um dos principais representantes do cinema francês. Não por acaso, Orson Welles, o criador de Cidadão Kane e A Marca da Maldade, nutria por ele admiração.
sábado, 26 de maio de 2012
Anna Karênina (Parte 1)
Transpor para a linguagem das telas um livro como o romance Anna Karenina, de Liev Tolstói (1828-1910), será sempre temerário. Em 1935, o diretor Clarence Brown assumiu o risco. No papel-título, um símbolo: a diva Greta Garbo.
Bela e charmosa aristocrata russo do século 19, Anna mantém um casamento insosso, de fachada, com o rico burocrata Alexei Karenin (o vilão Basil Rathbone). Em viagem a Moscou, onde resolve nova crise conjugal entre o irmão e a cunhada, conhece o sedutor conde Vronski (Fredric March). Ela arrasta-se à paixão, separa-se do marido e do filho, e passa a viver com o amante.
A aristocracia não a perdoa. Anna rompe com uma ordem social, na qual impera a hipocrisia e o fetiche do respeito às aparências. A situação termina em tragédia.
São particularmente bem feitas as cenas que transcorrem nas estações de trem. Aliás, são elementos-chave para a compreensão da história. Mesmo sem captar a densidade plena de Tolstói, o filme satisfaz o espectador.
A versão de Julien Duvivier da obra de Tolstói, realizada em 1948, com Vivien Leigh à frente, fica para a próxima postagem.
Bela e charmosa aristocrata russo do século 19, Anna mantém um casamento insosso, de fachada, com o rico burocrata Alexei Karenin (o vilão Basil Rathbone). Em viagem a Moscou, onde resolve nova crise conjugal entre o irmão e a cunhada, conhece o sedutor conde Vronski (Fredric March). Ela arrasta-se à paixão, separa-se do marido e do filho, e passa a viver com o amante.
A aristocracia não a perdoa. Anna rompe com uma ordem social, na qual impera a hipocrisia e o fetiche do respeito às aparências. A situação termina em tragédia.
São particularmente bem feitas as cenas que transcorrem nas estações de trem. Aliás, são elementos-chave para a compreensão da história. Mesmo sem captar a densidade plena de Tolstói, o filme satisfaz o espectador.
A versão de Julien Duvivier da obra de Tolstói, realizada em 1948, com Vivien Leigh à frente, fica para a próxima postagem.
quinta-feira, 24 de maio de 2012
Anne Baxter
Ao escrever a respeito da primeira narrativa cinematográfica de O Fio da Navalha, mencionei Anne Baxter (1923-1985). Uma das melhores atrizes de Hollywood. Com forte presença dramática, personificou nas telas mulheres frágeis, ambiciosas ou apaixonadas.
Mostrou dedicação e talento em obras famosas. No drama A Malvada (1950), do diretor Joseph L. Mankiewicz, como a hipócrita Eve Harrington (do título original em inglês, All About Eve ou Tudo Sobre Eve), Anne contracenou com Bette Davis. Foi seu principal papel.
No épico Os Dez Mandamentos (1956), segunda versão da vida de Moisés realizada por Cecil B. DeMille – a anterior é de 1923 –, viveu a exuberante rainha egípcia Nefertiti. A película fez sucesso no plano técnico, ganhando o Oscar de efeitos visuais.
Antes do estrelato, atuou em um dos filmes do chamado esforço de guerra: Cinco Covas no Egito (1943), de Billy Wilder. No elenco, o mitológico Erich von Stroheim.
Por tudo, Anne é uma permanente atração para o espectador.
Mostrou dedicação e talento em obras famosas. No drama A Malvada (1950), do diretor Joseph L. Mankiewicz, como a hipócrita Eve Harrington (do título original em inglês, All About Eve ou Tudo Sobre Eve), Anne contracenou com Bette Davis. Foi seu principal papel.
No épico Os Dez Mandamentos (1956), segunda versão da vida de Moisés realizada por Cecil B. DeMille – a anterior é de 1923 –, viveu a exuberante rainha egípcia Nefertiti. A película fez sucesso no plano técnico, ganhando o Oscar de efeitos visuais.
Antes do estrelato, atuou em um dos filmes do chamado esforço de guerra: Cinco Covas no Egito (1943), de Billy Wilder. No elenco, o mitológico Erich von Stroheim.
Por tudo, Anne é uma permanente atração para o espectador.
segunda-feira, 21 de maio de 2012
O Fio da Navalha
Há duas versões cinematográficas, ambas dos Estados Unidos, conhecidas de The Razor's Edge (O Fio da Navalha), grande romance do britânico Somerset Maugham (1874-1965). É a história de um jovem norte-americano, Larry Darrell, que busca um sentido para a vida. Nessa odisseia existencial, o personagem pensa, lê e viaja muito, passando pela Índia e Paris.
A primeira adaptação, de 1946, foi dirigida por Edmund Goulding. No papel do herói, o astro Tyrone Power. Gene Tierney interpreta a ambiciona Isabel Bradley, noiva de Larry. Anne Baxter encarna Sophie MacDonald, amiga do casal, uma doce e encantadora alcóolatra – Anne vence o Oscar na categoria atriz coadjuvante. John Payne é o rico Gray Maturin, amigo de Larry e futuro marido de Isabel, após esta romper o compromisso. O drama tem belos cenários e atuações incisivas
A segunda incursão nessa obra de Maugham ocorreu em 1984, pelas lentes de John Byrum. Bill Murray (Larry), Catherine Hicks (Isabel), Theresa Russell (Sophie), James Keach (Gray) e Denholm Elliott, como o esnobe e de bom coração tio de Isabel Elliott Templeton, estão no elenco. Murray, que também é coautor do roteiro, e Theresa têm um dos melhores momentos de suas carreiras. Comovente.
A primeira adaptação, de 1946, foi dirigida por Edmund Goulding. No papel do herói, o astro Tyrone Power. Gene Tierney interpreta a ambiciona Isabel Bradley, noiva de Larry. Anne Baxter encarna Sophie MacDonald, amiga do casal, uma doce e encantadora alcóolatra – Anne vence o Oscar na categoria atriz coadjuvante. John Payne é o rico Gray Maturin, amigo de Larry e futuro marido de Isabel, após esta romper o compromisso. O drama tem belos cenários e atuações incisivas
A segunda incursão nessa obra de Maugham ocorreu em 1984, pelas lentes de John Byrum. Bill Murray (Larry), Catherine Hicks (Isabel), Theresa Russell (Sophie), James Keach (Gray) e Denholm Elliott, como o esnobe e de bom coração tio de Isabel Elliott Templeton, estão no elenco. Murray, que também é coautor do roteiro, e Theresa têm um dos melhores momentos de suas carreiras. Comovente.
sábado, 19 de maio de 2012
A Face Oculta
Marlon Brando dirigiu um único filme, A Face Oculta (One-Eyed Jacks, Estados Unidos, 1961), um clássico do western. Stanley Kubrick estava escalado para realizá-lo. Mas, após problemas com Brando na escolha do elenco, deixou o encargo. O ator assumiu a tarefa.
Em uma história de traição, vingança e amor, Brando faz o papel de Kid Rio, um assaltante de bancos. Enganado pelo parceiro Dad Longworth, interpretado por Karl Malden, Rio, depois de alguns anos preso, parte para acertar as contas.
Considerado insólito pela crítica, pois Brando lançou mão de cenas incomuns para o gênero – como a frequente presença do mar –, a película tem momentos antológicos. Além disso, a presença dos parceiros Brando e Malden vale por si.
Outros grandes atores estiveram atrás das câmeras uma vez apenas. Dois exemplos. Charles Laughton (1899-1962) realizou o impressionante noir O Mensageiro do Diabo (1955), com Robert Mitchum na pele de um psicopata, e Peter Lorre (1904-1964) dirigiu Der Verlorene (1951).
Em uma história de traição, vingança e amor, Brando faz o papel de Kid Rio, um assaltante de bancos. Enganado pelo parceiro Dad Longworth, interpretado por Karl Malden, Rio, depois de alguns anos preso, parte para acertar as contas.
Considerado insólito pela crítica, pois Brando lançou mão de cenas incomuns para o gênero – como a frequente presença do mar –, a película tem momentos antológicos. Além disso, a presença dos parceiros Brando e Malden vale por si.
Outros grandes atores estiveram atrás das câmeras uma vez apenas. Dois exemplos. Charles Laughton (1899-1962) realizou o impressionante noir O Mensageiro do Diabo (1955), com Robert Mitchum na pele de um psicopata, e Peter Lorre (1904-1964) dirigiu Der Verlorene (1951).
quinta-feira, 17 de maio de 2012
Asfalto
Asfalto (no título original em alemão, Asphalt, 1929), do diretor Joe May, é um belo filme. É a história de um policial que deve prender uma linda ladra, mas é seduzido por ela. Ambos se apaixonam. Após o agente da lei cometer um crime, há queda e redenção, momentos em que existe grande força dramática. Um clássico do realismo social, nas palavras do crítico Jean Tullard.
A obra retrata um pouco do ambiente criminoso da Berlim dos últimos anos da República de Weimar, forma de governo que vigorou na Alemanha de 1919 a 1933, quando advém o nazismo como poder constituído.
Um pedaço da atmosfera descrita no romance Berlin Alexanderplatz, de Alfred Döblin, publicado em 1929, e transformado em minissérie de TV em 1980, por Fassbinder. Sobre esse período berlinense, boa referência é Antes do Dilúvio, obra do historiador e jornalista Otto Friedrich.
Erich Pommer foi o produtor de Asfalto. Ele produziu, entre outros marcos do cinema, O Gabinete do Dr. Caligari (1919) e O Anjo Azul (1930).
quarta-feira, 16 de maio de 2012
Spartacus em livro
Kirk Douglas, 95 anos, lançará um livro no dia 12 de junho. “Sou Spartacus!” conta os problemas pelos quais o ator passou ao produzir o épico de 1960, dirigido por Stanley Kubrick após a demissão de Anthony Mann, sobre a revolta de escravos romanos comandada pelo gladiador Espártaco. O veterano astro, que fez o papel-título de Spartacus, lança luz sobre o período do macartismo, movimento político anticomunista nos Estados Unidos. “A caça às bruxas destruiu vidas e carreiras. Eu fiz Spartacus com um roteirista que estava incluído na lista negra e que teve que se esconder sob um pseudônimo para encontrar trabalho”, afirmou. O roterista é Dalton Trumbo.
Com Kubrick, Kirk Douglas fez outro trabalhado marcante. Glória Feita de Sangue, de 1957, é um forte apelo contra injustiças cometidas em uma guerra. Sobre o tema, deve-se dizer que o próprio Trumbo escreveu e dirigiu, em 1971, o clássico Johnny Vai à Guerra, de teor antibelicista difícil de superar.
Spartacus talvez seja o filme pelo qual Kirk Douglas mais será lembrado. Assim como Charlton Heston, por Ben-Hur; Peter O’Toole, por Lawrence da Arábia; Omar Sharif, por Doutor Jivago.
Disque Butterfield 8
O filme BUtterfield 8 (Disque Butterfield 8), do diretor norte-americano Daniel Mann, não merece ser negligenciado. Rodada em 1960, essa história, a de uma prostituta apaixonada por um homem casado, ambos atormentados e encharcados pelo álcool, tem seus clichês, como aponta parte da crítica especializada. A bela fotografia e a forte representação de Elizabeth Taylor, na pele de Gloria Wandrous, valem por si. Por ela, Liz Taylor recebeu, em 1961, a primeira de suas duas estatuetas do Oscar de melhor atriz.
Uma curiosidade: o marido da musa à época, o cantor Eddie Fisher, atuou no papel de Steve Carpenter, amigo de Gloria. Ele é pai de Carrie Fisher, a princesa Leia, da série Guerra nas Estrelas.
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