sexta-feira, 31 de maio de 2013

Como Roubar Um Milhão de Dólares

O mercado lícito de arte movimenta valores astronômicos. Leilões batem recordes. O mesmo pode ser dito a respeito da transação ilícita do ramo. Esse lado da moeda é tratado pelo diretor William Wyler na comédia romântica Como Roubar Um Milhão de Dólares (How to Steal a Million, Estados Unidos, 1966), estrelado por Audrey Hepburn e Peter O'Toole.

A atriz interpreta Nicole, filha do rico colecionador de arte Charles Bonnet (Hugh Griffith). O pai diverte-se, e ganha dinheiro, forjando quadros de pintores famosos, como Van Gogh e Cézanne. A situação se complica quando ele empresta, a um museu de Paris, uma escultura de Vênus, atribuída a Cellini, falsa. Valor venal: um milhão de dólares.

Nicole resolve agir, a fim de salvar a reputação do pai. Ela convence o ladrão de obras de arte Simon Dermott (O'Toole, o astro de Lawrence da Arábia) a ajudá-la a subtrair a peça do local de exposição. Tarefa nada fácil. Com astúcia e habilidade, Simon é capaz de solucionar o problema.


Audrey Hepburn e Peter O'Toole lideram o elenco

No filme, figuras típicas desse universo comercial e estético, como o marchand e o comprador, transitam nas duas margens do mercado. O milionário americano Davis Leland (Eli Wallach, o  Calvera de Sete Homens e Um Destino), por exemplo, fica obcecado pela representação da deusa romana. Aceita comprá-la ilegalmente, mesmo que seja para deleite exclusivamente particular, distante de outros olhos. 

A carreira de Audrey Hepburn deve muito a William Wyler. Ele a consagrou em A Princesa e o Plebeu, rodado em 1953. Como Roubar Um Milhão de Dólares é um dos últimos trabalhos assinados pelo cineasta. O longa não integra a lista de obras-primas de Wyler. Porém agrada. 

segunda-feira, 27 de maio de 2013

A Princesa e o Plebeu

Roma, a Cidade Eterna, é o cenário da comédia romântica A Princesa e o Plebeu (Roman Holiday, Estados Unidos, 1953), produzido e dirigido pelo mestre William Wyler (Pérfida, Os Melhores Anos de Nossas Vidas, Ben-Hur e outros sucessos). Espécie de conto de fadas moderno, o filme tornou-se muito popular. Os astros Gregory Peck e Audrey Hepburn – até então, desconhecida artista – formam o par amoroso do longa.

A princesa Ann (Audrey) faz um tour diplomático por metrópoles europeias. Aborrecida com a rotina de compromissos, decide fugir e perambular pela capital italiana. Na aventura, ela conhece o jornalista americano Joe Bradley (Peck), jogador e bebedor intrépido. Joe, que não revela a verdadeira profissão para Ann, vê na ocasião a oportunidade de escrever lucrativa reportagem.

Joe convida Ann a realizar, naquele dia, tudo o que deseja, como se fosse um onírico feriado. Acompanhado do incógnito fotógrafo Irving Radovich (Eddie Albert), o casal visita pontos turísticos, como o Coliseu e a Boca da Verdade – Wyler utiliza a riqueza histórica romana com bastante desenvoltura. Nesse ínterim, agentes do país de Ann – o nome do Estado é indeterminado – partem em busca da herdeira do trono.

Diálogos inteligentes e bem-humorados e as peripécias da princesa e do plebeu rendem momentos especiais. As cenas sobre a motoneta, quando os protagonistas circulam na cidade, provocaram sensação nas plateias.


Audrey Hepburn e Gregory Peck protagonizam comédia romântica

Dalton Trumbo não pôde assinar o roteiro por estar preso. Perseguido pelo macartismo, movimento anticomunista, Trumbo precisou utilizar de pseudônimos para sobreviver. Frank Capra estava escalado para dirigir A Princesa e o Plebeu. Quando soube do envolvimento de Trumbo, recusou, por temer consequências. Wyller, diferente de Capra, aceitou o trabalho. A obra ganhou o Oscar nas categorias Melhor Atriz (Audrey), Melhor Figurino – modalidade preto e branco – e Melhor História Original.

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Gata em Teto de Zinco Quente

História visceral, Gata em Teto de Zinco Quente (Cat on a Hot Tin Roof, Estados Unidos, 1958), do diretor e roteirista Richard Brooks, retrata os dramas de uma infeliz família às voltas com a doença terminal do milionário patriarca. Adaptado da peça de Tennesse Williams, dramaturgo de primeira linha, o longa traz como protagonistas Elizabeth Taylor, Paul Newman e Burl Ives.

Cobiça, culpa, adultério e homossexualidade reprimida compõem o universo onde transitam intensos personagens. A censura americana, de cunho moralista, amenizou características centrais do texto de Williams.

A narrativa se passa na mansão do clã, no dia em que o Velho (Ives) completa 65 anos. A família esconde o diagnóstico de câncer avançado, o que provoca no doente o retorno do habitual temperamento dominador e autoritário. O primogênito Gooper (Jack Carson) e a mulher Mae (Madeleine Sherwood) não ocultam o desejo de se apossar, o quanto antes, da fortuna do rico proprietário de terras e ações. Para adulá-lo, Gooper e Mae produzem vários netos.

Newman vive o filho caçula – o predileto – Brick, famoso ex-jogador de futebol americano, que, com o tornozelo direito fraturado, anda de muleta praticamente todo o filme. Transformado em amargo alcoólatra, rejeita a esposa Maggie (Liz Taylor). Infeliz no casamento sem prole, a sexy Maggie tenta seduzir o agressivo e impotente marido. Sob o matrimônio pesa a sombra de Skipper, falecido colega de equipe de Brick. Há tênue, mas identificável, relação de fundo homossexual.


Newman e Liz Taylor têm interpretações marcantes em drama

As agressões verbais envolvendo Maggie e Brick se sucedem. A situação é delicada, como se Maggie fosse gata que andasse em teto de zinco quente. "Não vivemos juntos. Só dividimos a mesma jaula", afirma Liz Taylor. Saliente-se que os diálogos, junto às interpretações, são o forte da película.

As cenas-chave ocorrem entre Maggie e Brick e entre este e o pai. Ambos são incapazes de expressar o amor filial-paternal. O magnata construiu um império, deixando a família em segundo plano, o que revolta Brick.

Oriundo do jornalismo, Richard Brooks tinha senso crítico acurado. Realizou trabalhos de respeito. Os Irmãos Karamazov (1958), com Yul Brynner e Lee J. Cobb, é notável. Ao fim de cada gravação, não dizia "corta". Dizia "obrigado".

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Bunny Lake Desapareceu

No primeiro dia de escola, uma criança de 4 anos some. A mãe, desesperada, pede ajuda. A polícia entra em cena. Onde está a filha? Ou a pequena é fruto da imaginação da mulher? O enredo de Bunny Lake Desapareceu (Bunny Lake Is Missing, Reino Unido, 1965), dirigido por Otto Preminger, atrai o espectador. Suspense psicológico, o filme, à época do lançamento, não provocou o merecido aplauso. Com o tempo, o reconhecimento surgiu.

A americana Ann Lake (Carol Lynley) muda-se com o irmão Stephen (Keir Dullea) para Londres. Quando Ann vai ao colégio buscar Bunny, constata que ninguém sabe seu paradeiro. O detetive Newhouse, vivido pelo grande ator shakespeariano Laurence Olivier – Henrique V, de 1945, e Hamlet, de 1948, são exemplares –, e seus agentes investigam as hipóteses possíveis.

O que mais intriga o perspicaz Newhouse é o fato de não ser encontrada nenhuma evidência material da existência de Bunny. Nenhuma boneca. Nenhum vestido. Nenhum registro escrito. Também rende especulações a estranha relação entre os irmãos. Stephen, mais zeloso com a irmã do que com a sobrinha, debilmente encobre o sentimento incestuoso que o instiga.


Suspense psicológico realizado pelo diretor Otto Preminger

Aflige o drama pessoal de Ann, jovem e frágil mãe – Carol interpreta muito bem o papel. Esse elemento acompanha a narrativa do começo ao fim, proporcionando forte tensão, o que foi explorado intensamente por Preminger.

Nascido no antigo Império Austro-Húngaro, em 1905, Otto Ludwig Preminger saiu de Viena, na Áustria, em 1935, e foi trabalhar nos Estados Unidos. Um dos nomes importantes do cinema noir, realizou, entre outros sucessos, Laura (1944), Anatomia de Um Crime (1959) e Exodus (1960).

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Agonia de Amor

Pouco lembrado pelos admiradores de Alfred Hitchcock, Agonia de Amor (The Paradine Case, Estados Unidos, 1947) é trabalho virtuoso. História de crime, julgamento e castigo, o filme foi a segunda e última parceria do diretor com o astro Gregory Peck. Dois anos antes, gravaram Quando Fala o Coração, com Ingrid Bergman no elenco.

Londres, depois do fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). A bela e fascinante Maddalena Anna Paradine (Alida Valli) é presa, acusada de envenenar o marido, o milionário coronel Paradine. Por meio do amigo da família Simon Flaquer (Charles Coburn), o hábil advogado Anthony Keane (Peck) recebe o encargo de defendê-la.

Keane envolve-se profundamente no caso Paradine, muito mais do que o recomendável do ponto de vista profissional e jurídico. Apaixona-se pela ré, cujo passado arrepia. A relação abala o tranquilo casamento burguês do protagonista com Gay Keane (Ann Todd).


Gregory Peck e Alida Valli atuam em virtuosa obra de Hitchcock

A estratégia do criminalista, para inocentar a cliente, passa por jogar a culpa do assassinato sobre outra pessoa, o que tem influência decisiva na trama. Maddalena enfrenta o Tribunal do Júri, presidido pelo implacável e libidinoso juiz Thomas Horfield (o extraordinário Charles Laughton), em momentos incisivamente dramáticos. Deve-se observar com atenção os movimentos de câmera nas sequências no interior do tribunal. Lamentável que os diálogos envolvendo o personagem de Laughton – os melhores  da película – não ocorrem com maior frequência.

Os 39 Degraus. Rebecca, a Mulher Inesquecível. A Sombra de Uma Dúvida. Um Barco e Nove Destinos. Quando Fala o Coração. Interlúdio. Agonia de Amor. Festim Diabólico. Disque M para Matar. Janela Indiscreta. Ladrão de Casaca. O Homem Que Sabia Demais. Um Corpo Que Cai.  Psicose. Os Pássaros.

O que dizer, ainda, sobre Hitchcock?

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Ladrão de Casaca

Ladrão de Casaca (To Catch a Thief, Estados Unidos, 1955) é um dos mais charmosos suspenses dirigido por Alfred Hitchcock. Riviera Francesa, pedras preciosas, boa comida e bebida, romance, sofisticação  e mistério são elementos que enlaçam Gary Grant e Grace Kelly, principais atores desse clássico das telas.

O luxuoso litoral francês é abalado por furtos de joias. Em decorrência das características dos crimes, o modus operandi, a polícia suspeita que o ex-ladrão e bon-vivant John Robie (Grant), O Gato, seja o autor dos delitos. Ele nega qualquer envolvimento.

Para escapar da prisão o protagonista alia-se ao agente de seguros H. H. Hughson (John Williams). Na estratégia traçada por Robie para descobrir o verdadeiro responsável, a deslumbrante e rica americana Frances Stevens (Grace) torna-se peça-chave. A mãe de Frances, Jessie Stevens, interpretada pela ótima Jessie Royce Landis, ostenta acessórios caros. Jesse é a isca perfeita.  

Filme típico de Hitchcock, Ladrão de Casaca atesta plenamente o bom gosto e a técnica refinada do realizador.  As perseguições de automóveis, com as exuberantes paisagens como cenário; as sequências na praia, diante do hotel Carlton, em Cannes; Frances, vestida com longo branco, provoca Robie no quarto, enquanto os fogos de artifício estouram no horizonte; a caçada no telhado, com enquadramentos calcados no expressionismo alemão, são momentos preciosos da obra.


Grace Kelly mostra beleza, elegância e talento no filme de Hitchcock

Grace Kelly personificou como poucas atrizes o ideal de beleza física e elegância, a classe e toilette da dama. Estrela de Disque M para Matar e Janela Indiscreta, ambos de 1954, foi uma das louras fatais de Hitchcock. Em 1956, Grace virou princesa de Mônaco, o que encerrou sua carreira. Na novela Os Segredos da Princesa de Cadignan, o francês Honoré de Balzac (1799-1850) escreveu que "uma das glórias da sociedade é a de ter criado 'a mulher' onde a natureza criou uma fêmea (...)".

quinta-feira, 2 de maio de 2013

Quando Fala o Coração

Alfred Hitchcock explorou temas da psicanálise para realizar Quando Fala o Coração (Spellbound, Estados Unidos, 1945). Os astros Gregory Peck e Ingrid Bergman, no auge da beleza, estão no centro desse espetáculo do mestre do suspense. Hitchcock também trabalhou com Ingrid em Interlúdio (1946) e Sob o Signo de Capricórnio (1949). Com Peck, em Agonia de Amor (1947).

Em Quando Fala o Coração, Peck interpreta o médico Anthony Edwardes, o novo diretor da clínica de doentes mentais onde trabalha a dra. Constance Petersen (Ingrid). Ele chama a atenção dos colegas, pois é bem mais jovem do que o esperado. Constance encanta-se com o personagem. Logo todos ficam perturbados com o estranho comportamento de Edwardes.

Quem é, afinal, o novo diretor? Impostor? Assassino? Amnésico, nem Edwardes sabe a resposta.  Constance encarrega-se de ajudá-lo, como analista, a descobrir a verdadeira identidade, para livrá-lo do sentimento de culpa que tanto o martiriza. Ingrid mistura o papel de médica e amante de Peck. Razão e coração transformam-se em contraditórios meios de investigação.

Na  famosa sequência onírica da obra, Peck relata intrigante sonho – outro tópico freudiano. O cenário foi criado pelo pintor Salvador Dalí, convidado por Hitchcock a participar do trecho do longa. O movimento surrealista, saliente-se, recebeu forte e determinante influência das ideias de Sigmund Freud.


Sequência onírica do filme Hitchcock foi criada por Salvador Dalí

As qualidades de Quando Fala o Coração impressionam. O diretor e crítico François Truffaut afirmou certa vez, na revista Cahiers du Cinéma, que Hitchcock representa, ao mesmo tempo, o lado comercial e a sofisticação da sétima arte. Soma-se a isso o fato de ter sido extraordinário técnico e exímio contador de histórias. A lista de filmes formidáveis é imensa.