terça-feira, 30 de julho de 2013

Sem Novidades no Front

A Primeira Guerra Mundial (1914-1918) provocou o colapso da civilização ocidental. A conflagração entre Aliados (Reino Unido, França, Rússia, Estados Unidos e outros) e impérios centrais (Alemanha,  Áustria-Hungria, Bulgária e Império Otomano) mudou o mapa global. Marcou, à época, o apogeu da carnificina bélica. Lênin, com sua habitual lucidez, apontou que o evento era um confronto "imperialista" da burguesia. Poucos anos depois, a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) levou ao maior grau de destruição e assassinato em massa até hoje conhecido.

Sem Novidades no Front (All Quiet on the Western Front, Estados Unidos, 1930) é um dos melhores retratos da Primeira Guerra Mundial. Realizado por Lewis Milestone e baseado no romance homônimo de Erich Maria Remarque (1898-1970), o drama representa extraordinário manifesto pacifista – o livro foi proibido pelos nazistas. Esmerada produção, venceu o Oscar de Melhor Filme e Melhor Diretor.

A narrativa acompanha a trajetória de um grupo de estudantes alemães que, insuflado pelo nacionalismo do professor, se alista como voluntário na infantaria germânica. A dureza do treinamento e o rigor do sargento – sádico – mostram aos jovens o gosto da realidade futura nas terras francesas. A alegria da marcha para a linha de choque dá lugar ao batismo de fogo, aos ferimentos, à morte. Bombas, tiros de metralhadora e fuzil dizimam, pouco a pouco, a tropa atolada nas trincheiras.


Drama pacifista é marco dos bons filmes de guerra 
 
O contato dos novatos com os veteranos; a busca por comida, diversão e mulheres; a camaradagem na caserna; o medo que nasce sob a imensa pressão do combate; a comida racionada pelo gordo e safado cozinheiro; o hospital repleto de baixas; a noite iluminada pelas luzes do inimigo; o campo cravado de buracos de obuses. Enfim, esses e outros elementos compõem a miscelânea do quadro, onde estar vivo é a principal vitória. Não há novidades, apenas as mesmas notícias de óbito e sofrimento.

Sem Novidades  no Front, história também conhecida como Nada de Novo no Front, permanece farol de advertência para todas as gerações. Interpretações marcantes, alta qualidade e realismo das tomadas consagraram a película, constante referência de bom filme de guerra.

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Perfume de Mulher

Cômico e dramático. Assim é Perfume de Mulher (Profumo di Donna, Itália, 1974), do diretor Dino Risi, com o astro Vittorio Gassman no papel principal. Em 1992, Martin Brest realizou nova e festejada versão, com Al Pacino à frente.

No longa de Risi, Gassman interpreta o capitão Fausto, militar que fica cego após um acidente explosivo. Irascível, o personagem não tolera piedade e discordância. O jovem soldado Giovanni Bertazzi (Alessandro Momo), o Ciccio, torna-se o novo auxiliar do oficial. Ciccio acompanha Fausto em viagem a Gênova e Roma, onde compromissos pessoais inadiáveis aguardam o capitão.

A jornada envolve situações hilárias. Com muito uísque – 12 anos, claro – e tabaco, Fausto assusta o contido Ciccio, não acostumado ao peculiar humor daquele. Insulta desconhecidos pelo caminho, na cabine do trem ou no bordel. O capitão procura prostitutas de determinadas características e medidas – gosta de morenas opulentas. O cheiro da fêmea, o perfume da mulher o atiça. Dinheiro não é problema, afinal tem e é generoso com o metal.

Gassman mostra seu talento em filme de Dino Risi

Celebração da vida, talvez da morte, Perfume de Mulher proporciona reflexão. Fausto, como ele mesmo diz, é carta inexistente, carta que não cabe no baralho. Ele se sente um homem desajustado, "inválido", alheio à sociedade que privilegia a imagem em detrimento do som, o sol ao invés da chuva. Nada que o faça abondonar alegrias da vida, como o festim e o sexo. Mas não falta a Fausto, filósofo à sua maneira, a melancolia do que passou e poderia ter sido.

A atuação sensacional de Gassman – um dos nomes mais populares do cinema italiano – rendeu a estatueta de melhor ator no Festival de Cannes de 1975. No ano seguinte, a obra arrebatou o prêmio César de melhor filme estrangeiro.  Vale a pena comparar as duas versões da história.

domingo, 21 de julho de 2013

O Fantasma da Ópera

O ator Lon Chaney brilha em O Fantasma da Ópera (The Phantom of the Opera, Estados Unidos, 1925), dirigido por Rupert Julian, a primeira e mais célebre versão cinematográfica do romance homônimo do francês Gaston Leroux (1868-1927). Produzido pela Universal, assim como Drácula (1931) e Frankenstein (1931), até hoje impressiona. Os cenários suntuosos e a atuação e caracterização de Chaney marcaram, de forma indelével, a história dos filmes de terror.

Chaney interpreta Erik, músico autodidata que teve o rosto desfigurado. Revoltado com o mundo, ele vive nos subterrâneos da Ópera de Paris, provocando assombro em quem passa pelo local, como se fosse um fantasma. Apaixona-se por Christine Daae (Mary Philbin), cantora lírica que busca a primazia do palco.

Para obter o amor da jovem, ele a sequestra, após ajudá-la na carreira, por meio de ameaças. Christine é noiva de Raoul de Chagny (Norman Kerry), que, auxiliado pela polícia, busca salvar a moça da lascívia do misterioso personagem. A procura revela-se difícil. Cheia de perigos e armadilhas. O Fantasma da Ópera mostra-se terrível inimigo. Autenticamente monstruoso.

Atuação de Lon Chaney aterrorizou plateias

A película tem sequências antológicas. Exemplos: o momento em que Erik toca órgão e aparece com o verdadeiro rosto; o baile de máscaras (única cena gravada em cores; a maior parte da película é em preto e branco), com Erik representando a Morte; as tomadas no telhado do prédio da Ópera, com a capital francesa ao fundo.

Lon Chaney, conhecido como "o homem das mil faces" em virtude da apurada técnica de maquiagem, foi um dos grandes nomes do cinema mudo.  Interpretou homens estranhos, não alinhados ao conceito tradicional de "normalidade". Morreu em 1930, depois de ser cotado para o papel de Drácula na obra realizada por Tod Browning. O trabalho proporcionou ao húngaro Béla Lugosi tornar-se lenda.

terça-feira, 16 de julho de 2013

Shalako

Nem John Wayne. Nem Gary Cooper. Nem Clint Eastwood. Os protagonistas do western Shalako (Reino Unido, 1968), do diretor Edward Dmytryk, são Sean Connery e Brigitte Bardot. À época, o astro da série 007 e a musa francesa já eram nomes de proa das telas. Por isso, a união causou sensação no meio cinematográfico.

Aristocratas europeus viajam ao Oeste dos Estados Unidos para caçar. O safári, misto de crueldade e aventura, é realizado em território apache. Inflamada pelo instinto de matar, a condessa Irina Lazaar (Brigitte), atrás de novas vítimas, se separa do grupo. Fustigada por guerreiros índios a cavalo, é salva por Shalako (Connery), ex-coronel do exército americano.

Sean Connery e Brigitte Bardot são protagonistas de western

Shakalo pede para que eles deixem a reserva. Porém, o líder da expedição, barão Frederick von Hallstatt (Peter van Eyck), se recusa a seguir o conselho. A partir de então, são atacados e perseguidos pelos donos da terra.  Surge a hora de amar e a necessidade de destruir a vida para sobreviver. Bom de tiro e conhecedor das táticas apaches de batalha, Shakalo assume a tarefa de salvá-los.

Mesmo que não seja um grande western, a película tem bons momentos, afora a curiosidade provocada pelo elenco. A beleza de BB, um dos principais símbolos sexuais da sétima arte, e o talento de Connery  sempre serão fatores de atenção para o espectador. A cena em que Brigitte se banha a céu aberto é inesquecível.

Descendente de ucranianos, Edward Dmytryk foi acusado de comunista no período do macartismo. Durante depoimentos, teria citado nomes de colegas, comprometendo-os com autoridades. Sobre o cineasta caíram pesadas críticas.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

O Morro dos Ventos Uivantes

William Wyler dirigiu a mais célebre versão do romance O Morro dos Ventos Uivantes, da britânica Emily Brontë (1818-1848), retrato agudo e surpreendente do mal. Laurence Olivier, Merle Oberon e David Niven lideram o elenco dessa empolgante história de amor, ódio e vingança. O Morro dos Ventos Uivantes (Wuthering Heights, Estados Unidos, 1939) é um filme inesquecível. O longa recebeu o Oscar de Melhor Fotografia em Preto e Branco.

Narrado com a técnica de flashback, o drama começa quando um viajante chega, em meio à tempestade de neve, à inóspita propriedade do Morro dos Ventos Uivantes, na área rural da Inglaterra. Lá, ouve a trajetória do intratável Heathcliff (Olivier), atual dono do local.

Heathcliff, quando era órfão maltrapilho, foi levado para a residência pelo pai de Hindley (Hugh Williams) e Cathy (Merle) Earnshaw, então crianças. Hostilizado pelo menino, Heathcliff recebe o carinho da filha. Quando o chefe da família morre, ele perde a proteção, sofrendo, a partir de então, humilhações por parte de Hindley, que o trata brutalmente e o põe a trabalhar na estrebaria.

Laurence Olivier atua na mais célebre versão do romance

Cathy, já adulta, conhece o rico Edgar Linton (Niven), e com ele um novo mundo de prazeres e luxo, afastando-se do humilde Heathcliff. O personagem de Olivier promete vingança contra todos os que o maltrataram. A ligação entre Cathy e Heathcliff, porém, mostra sua força e resistência, ultrapassando o tempo.

Ator shakespeariano, sir Laurence Olivier continua a ser referência na arte da interpretação. Também foi competente do outro lado das câmeras. Realizou películas notáveis, como Henrique V (1946) e Hamlet (1948).

O som do vento persiste no sombrio morro...

terça-feira, 2 de julho de 2013

O Processo

Orson Welles assumiu o desafio e os riscos de levar às telas o romance complexo de Franz Kafka (1883-1924) O Processo. Com Anthony Perkins no papel de Joseph K., o criador de Cidadão Kane filmou o esplendido O Processo (The Trial, Alemanha Ocidental-França-Itália, 1962), com locações externas em Zagreb, na antiga Iugoslávia. Além das qualidades estéticas e narrativas, a interpretação do trágico personagem kafkiano é primorosa. Completam o elenco principal Romy Schneider, Elsa Martinelli, Jeanne Moreau, Akim Tamiroff e Welles.

Em uma manhã qualquer, K. é surpreendido no quarto por policiais. Enquanto acorda, espanta o sono e se veste, os agentes anunciam a prisão. Porém, K. desconhece o crime de que é acusado. Ele alega inocência, mas em vão. A partir disso, a trama, ou pesadelo, se desenvolve.

K. passa por várias situações absurdas. A máquina do Estado e sua burocracia são opressivas e, incomodamente, incompreensíveis. Nesse processo judicial, metáfora da condição humana, a estrutura esmaga o indivíduo.

O réu pede auxílio ao advogado Albert Hastle (Welles). Na residência do defensor, ele encontra a enfermeira Leni (Romy) e o cliente Bloch (Tamiroff). Nesse ambiente irreal, Joseph descobre ligações insuspeitas.


Perkins interpreta o trágico personagem de Franz Kafka

Belas e consistentes imagens se sucedem. Como é típico do trabalho de Welles, a fotografia recebe esmerado cuidado. A película é acompanhada pela clássica música de Tomaso Albinoni – o famoso Adágio – e por jazz. Essa combinação, nas mãos de um cineasta de tal estatura técnica, funciona perfeitamente. Welles venceu o desafio, apesar das desconfianças de críticos pessimistas de que seria impossível reproduzir o enredo e a atmosfera do livro.

Antes de atuar em O Processo, Perkins entrou para a história da sétima arte ao viver o esquizofrênico assassino Norman Bates em Psicose (1960), Alfred Hitchcock. Os personagens atormentados continuaram a frequentar a carreira do ator.