segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Cinco Covas no Egito

Na década de 40 do século passado, o cinema contribuiu, de forma marcante, na luta ideológica contra o nazifascismo. Casablanca (1942), por exemplo, integra a lista de filmes do esforço de guerra. Outro título notável é Cinco Covas no Egito (Five Graves to Cairo, Estados Unidos, 1943), dirigido pelo mestre Billy Wilder. Destacam-se no elenco do drama a inesquecível Anne Baxter (Eve, de A Malvada) e o extraordinário Erich von Stroheim (o mordomo e motorista Max von Mayerling, de Crepúsculo dos Deuses, também de Wilder).

A Segunda Guerra Mundial espalha-se no Norte da África. Em 1942, as forças do general alemão Rommel (Von Stroheim) avançam no deserto do Egito, rompendo as linhas dos britânicos. No recuo, o cabo tanquista John J. Bramble (Franchot Tone) fica para trás. Sozinho, sob sol e calor, caminha vários quilômetros até encontra um vilarejo. Refugia-se no hotel onde trabalha a francesa Mouche (Anne), que não esconde sua hostilidade com Bramble. A jovem quer, acima de tudo, a liberdade do irmão, preso na Alemanha.

Anne Baxter e Erich von Stroheim atuam no drama de guerra

A situação se complica quando tropas inimigas chegam ao local, transformando o hotel em quartel-general de Rommel. A fim de evitar a captura, Bramble adota a identidade de Davos, o coxo garçom. A intensidade do perigo aumentar, porque, na realidade, Davos é um agente do Terceiro Reich infiltrado na retaguarda britânica.

Mas a proximidade com o comandante alemão proporciona a Bramble a chance de se apoderar de fundamental informação estratégica: a localização dos pontos onde estão enterrados materiais – combustíveis, peças de reposição etc. – essencias para as unidades motorizadas do Afrika Korps, o corpo expedicionário de Rommel. Os esconderijos logísticos são as cinco covas no Egito.

O jornal Folha da Tarde – antigo diário da capital gaúcha –, na edição de 29 de novembro de 1943, publicou texto do pioneiro crítico de cinema do Rio Grande do Sul, Plínio Moraes (pseudônimo de Jacob Koutzii). Ele analisou a importância das películas antinazistas, sustentando seu valor: "O cinema também é uma frente de combate" (A Tela Branca. Porto Alegre, Unidade Editorial/Porto Alegre, 1997).

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

A Mulher na Lua

Dois anos após filmar o icônico Metrópolis, o diretor Fritz Lang foi atraído novamente à ficção científica. Mais "modesto" na temática visionária que o anterior, A Mulher na Lua (Frau im Mond, Alemanha, 1929), fruto da parceria com a escritora e roteirista Thea von Harbou (mulher do cineasta), tem cenas sensacionais.

No fim do século 19, um cientista apresenta a teoria de que há ouro na Lua. Passam-se décadas, até que, enfim, uma expedição é enviada ao satélite terrestre. O heterogêneo grupo, composto por seis pessoas, entre elas a estudante de astronomia Friede Velten (Gerda Maurus), mostra a força da cobiça, do amor e da morte.

O melhor da película começa a partir do momento em que o foguete – construção gigantesca – desliza rumo à plataforma de lançamento. As dimensões do dispositivo, ao deixar o hangar, impressionam. Como se fosse o Cabo Canaveral, nos Estados Unidos, o público e a imprensa acompanham a partida.

Contagem regressiva. (...) Quatro. Três. Dois. Um. Ignição. O foguete segue para o espaço, fronteira desconhecida do homem. Também chama a atenção o fato de ele se dividir em estágios, como os do Projeto Apollo. Além disso, Lang retrata, no interior da espaçonave, a microgravidade – ausência de peso. A superfície lunar ganha contornos arenosos e pedregosos. Magia do cinema.


Filme é da mesma estirpe de outros clássicos da ficção científica

A Mulher na Lua é da mesma estirpe de outros clássicos da tela. Exemplos. A Conquista do Espaço (1955), de Byron Haskin, notável pelas trucagens. Os Primeiros Homens na Lua (1964), adaptação da novela homônima de H. G. Wells e dirigido por Nathan Juran. 2001 - Uma Odisseia no Espaço (1968), espetáculo visual assinado por Stanley Kubrick.

Depois de A Mulher na Lua, Lang roda, em 1931, o fenomenal M, o Vampiro de Düsseldorf, com Peter Lorre à frente do elenco. Em 1932, Thea ingressa no Partido Nazista e permanece na Alemanha, a serviço da súcia, enquanto Lang, em 1934, emigra para os Estados Unidos, onde prossegue a carreira.

sábado, 14 de setembro de 2013

Seção Especial de Justiça

O grego Constantin Costa-Gavras, que completou 80 anos em fevereiro, tornou-se mundialmente conhecido como um diretor de filmes "políticos". Denunciou a ditadura dos coronéis gregos em Z (1968); a burocracia stalinista do Leste Europeu em A Confissão (1970); o envolvimento americano no golpe militar no Chile em Desaparecido, um Grande Mistério (1982) – o meu predileto, aliás.

Em Seção Especial de Justiça (Section Spéciale, Alemanha-França-Itália, 1975), Costa-Gavras aborda um tema vexatório e doloroso na França: o colaboracionismo durante a Segunda Guerra Mundial.

Tropas alemãs invadem o território francês em maio de 1940. Cinco semanas de luta depois, Paris se rende. O país é dividido em duas zonas. Uma, subordinada diretamente a Berlim. Outra, controlada pela administração fantoche do marechal Henri Philippe Pétain  – o regime de Vichy. O governo, de direita, fica marcado pela faceta pró-nazista, anticomunista e antissemita.  Ao utilizar fatos reais, Costa-Gavras lança luzes sobre o período.

Nos primeiros tempos de ocupação, pequeno grupo de jovens da Resistência mata um oficial alemão no metrô parisiense. Os alemães, como retaliação, pretendem assassinar 50 cidadãos franceses. O Ministério propõe diferente caminho: levar a juízo seis homens, condenando-as à morte na guilhotina. Porém, existe problema: não há lei que os puna.

A cúpula do governo resolve criar norma prejudicial aos acusados, com efeito retroativo, ferindo um princípio do Direito. Nullum crimen, nulla poena, sine lege, diz o brocardo. Ou seja, "Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal", na expressão do Código Penal brasileiro.

Apesar da renitência de alguns juristas, logo a ideia recebe a adesão de membros do Judiciário. Então, a malta, de posse do novo texto legal, forja um tribunal de exceção, a Seção Especial de Justiça. A corte julga os réus, escolhidos entre comunistas e judeus condenados por delitos de baixo potencial ofensivo. A injustiça da medida é flagrante, explícita. Capítulo vergonhoso da história francesa.


Filme aborda o governo de Vichy e medidas legais injustas 

No elenco, dois nomes se destacam. Michael Lonsdale (O Nome da Rosa e Homens e Deuses), no papel de ministro do Interior, e Jacques Perrin (Cinema Paradiso), que interpreta um dos advogados.

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Cinema e os 40 anos do golpe militar no Chile

O golpe militar no Chile completa 40 anos neste 11 de setembro. O movimento da direita radical derrubou o presidente socialista Salvador Allende e conduziu ao poder o general Augusto Pinochet. A via chilena do socialismo foi interrompida, o que resultou numa das ditaduras fascistas mais brutais do continente.

Há vários e excelentes filmes sobre o período. O blog destaca dois.

Chove Sobre Santiago (1975), do diretor Helvo Soto, retrata aqueles dias dramáticos, da vitória da Unidade Popular à ascensão dos militares. A obra mostra as prisões e fuzilamentos de militantes pró-governo constitucional. A trilha sonora é do argentino Astor Piazzolla.

Desaparecido, um Grande Mistério (1982), realizado por Costa-Gavras. O longa, com Jack Lemmon no elenco, mostra a história do sumiço de um jornalista americano nos primeiros dias após a queda de Allende.

terça-feira, 3 de setembro de 2013

Rebecca, a Mulher Inesquecível

Rebecca, a Mulher Inesquecível (Rebecca, Estados Unidos, 1940) abre a fase americana do diretor britânico Alfred Hitchcock. Notável suspense, ganhou o Oscar nas categorias Melhor Filme e Melhor Fotografia em Preto e Branco. No elenco, Laurence Olivier,  Joan Fontaine – em começo de carreira –, Judith Anderson e George Sanders. Hitchcock mostra, de forma exemplar no longa, a riqueza de seus recursos técnicos, fonte de admiração.

Joan interpreta uma jovem humilde – o prenome é desconhecido – que se apaixona pelo rico e aristocrata Maxim de Winter (Olivier). Viúvo, ele é perseguido pela lembrança da falecida esposa, Rebecca. Após o rápido casamento, os dois passam a viver em Manderley, vasta propriedade da família de Maxim.

A luxuosa casa é impregnada de marcas de Rebecca. O ambiente intimida a nova sra. De Winter, mulher frágil e insegura. A governanta sra. Danvers, interpretada magistralmente por Judith Anderson, aterroriza a sucessora, não admitindo que ela assuma o seu lugar de direito. As sequências em que as duas contracenam são sensacionais, com requintes psicológicos que dão à película momentos de tensão.


Joan Fontaine e Judith Anderson contracenam em notável suspense

Sob a sombra da antecessora, a sra. De Winter passa os dias atormentada, por vezes solitária, o que culmina na dramática cena do baile à fantasia. Atrás de informações sobre Rebecca, a personagem de Joan colhe, pouco a pouco, segredos da mansão. A narrativa Hitchcock alcança novo e vertiginoso ritmo com a surpreendente reviravolta da história.

Depois do sucesso de Rebecca, a Mulher Inesquecível, Laurence Olivier consolidou-se como grande ator shakespeariano também nas telas. Joan Fontaine, irmã de Olivia de Havilland e, assim como esta, um dos mais belos rostos de Hollywood, continuou a exitosa carreira. Nonagenárias, as duas são memórias vivas dos anos de ouro da indústria cinematográfica americana.